quarta-feira, 6 de novembro de 2013

oração


Pesou-me na carne sua coroa de espinhos
E eu nada quis ser para não fazer barulho

Ira Buscacio, Um estranho quase íntimo


fotografia de jorge pimenta


mãos a prumo em novelo
de lã,
pulsação do sangue
estação quente e
cio,
toda a seiva masculina
a escavar o ventre
na incandescência
do fogo

aqui
o corpo a cerzir
cansaços,
ali
artérias a rugir
embaraços

enquanto das gengivas
escorrem
migalhas de pão
e mesa vazia
porque lá fora és somente
chuva frio e tantos vestígios
de setembros e
desfolhadas
naufragados no calendário
de frutas macias e outras tantas
fulgurações

é esta a canção do homem
em que fundes o corpo e cada uma das
recordações:

a memória é dardo e mãos
a farejar o ouro que
não é.


32 comentários:

  1. "... toda a seiva masculina
    a escavar o ventre
    na incandescência
    do fogo..."

    Crias imagens esplendorosas, Jorginho! Eu adivinho o ser que há em ti pela beleza e infinitude de imagens raras que crias. Os versos destacados da Ira, lá em cima, fizeram-me parar e ficar, quando estive comentando o blogue da poeta. Aliás, há um quê em comum entre tu e ela, embora cada um ao seu modo: ambos me tiram o fôlego completamente; ambos não podem caber em um simples corpo, numa única cabeça...vocês têm "gigantices" surpreendentes. Beijo, meu amigo poeta maravilhoso!


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    1. a ira é uma imensa mulher-poeta-poema, taninha, e as palavras em que me associas a ela e à sua escrita emudecem-me a voz. grato pela tua ternura de sempre, querida amiga escultora de sensações e de tantas viagens!

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    2. Taninha e Jorgito, o universo foi de uma gentileza tamanha quando me deu vocês. Sou gostadora dos dois, tanto que nem sei. Obrigada!
      bjs tantos

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    3. Jorgito e Taninha, o universo foi de uma gentileza tamanha quando me deu vocês. Sou gostadora dos dois e tanto que nem sei. Obrigada!
      bjs tantos

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    4. Quem cria sentidos infinitos não tem o que agradecer: vocês são co-criadores dessa minha vida que germina! Beijos aos dois..

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  2. há neste cantar aquele eco de eras tão primevas
    que se incorporam na pele e no suor dos dias


    abração

    p.s. beijão pra Ira que surgiu como leitmotiv

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    1. ira-inspiração.
      palavras tuas são acenos que guardo com carinho e amizade; ouro para vós!

      abraços!

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  3. E o silêncio que se faz depois das tuas palavras permite-nos vestir na perfeição a oração que nos afaga.

    Abraço Jorge
    cvb

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    1. belíssima a extensão do silêncio a escorrer das tuas palavras, cecília.

      um beijo

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  4. As leituras de hoje estão me sugerindo a palavra, ou ideia, Preamar... E não somos todos movidos a Preamares? A palavra no seu fluxo de ir e vir nos navegando!

    Sempre uma viagem de tantos rumos te ler! E Iracema brilhando lá no alto!

    Beijos, meu amigo das imagens pulsantes!

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    1. alguém um dia terá escrito que somos todos os textos: os que lemos, os que escrevemos e os que vivemos na rota das palavras: "ires e vires nos navegando".

      beijinho, jô de tantos infinitos-do-dizer!

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  5. Lindo! cada momento, cada pulsar desta oração!
    perfeita combinação este post, como só tu o fazes, querido amigo.
    frase da ira, foto, versos teus e música, incríveis emoções!

    beijinho!

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    1. há preces que me vou esquecendo de dizer; outras, dizem-me, qualquer que seja o estado ou a circunstância.

      sempre tão especiais as tuas palavras e presença, querida andy!

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  6. oração da vida no leito de amar Jorge..
    Ira sempre intensa inspiração...
    beijos querido Poeta

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    1. aquele que ama, vive - tão simples a equação, verdade, ingrid?
      ira sempre uma inspiração.

      beijinho!

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    2. aquele que ama, vive... ou, pelo menos, não sabe morrer...

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  7. sensualidade a escorrer na seiva da pulsante palavra...
    e, no silêncio, num eco surdo e sibilante,
    impera o Amor, perpetua-se o Instante...

    Beijinho meu, querido amigo!

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    1. a palavra incolor, indolor, mas que na sua translucidez muda é cor e dor, a palavra, essa, fecunda, alcina.

      beijinho, querida amiga!

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  8. Oração que se funde
    corpo/lembrança
    a cada singular instante

    Beijão, Jorge!

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    1. porque somos tantas vezes tão pouco mais do que isso, marlene: singulares instantes a recrudescer breves eternidades.

      beijo meu!

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  9. Belas palavras de Ira, foto especial e vídeo lindo. Tudo para emoldurar seus preciosos versos. Eles nos trazem emoção, talvez a mesma que lhe serviu de inspiração. Bjs.

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    1. sempre ternas as tuas palavras, marilene; grato.

      beijinho!

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  10. Uau, Jorginho! És o mais encantador dos poemas seus que já li. Forte, muito forte. Uma oração para várias releituras. A começar pelo incipit de Ira, tão pertinente!

    Seu blog é muito esmerado :) Beijo!

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    1. ira é sempre uma inspiração, adri :)

      beijinho, pétala poética :)

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  11. do orvalho retiro o ouro abundante que há. eis minha prece e elevação!
    bj, poeta dourado

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    1. geometria de estrelas com pontas perfeitas a reverberar ouro abundante: a tua voz-inspiração, ira.

      beijinho, querida amiga!

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  12. Meu querido Poeta

    Como sempre as palavras faltam-me para te comentar e remeto-me ao silêncio deste momento que estou a sentir.

    Um beijinho com carinho
    Sonhadora

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    1. um beijinho em silêncio ao som de uma melodia que me tocou imenso há instantes e que trouxe lá do RosaSolidão.

      beijinho, amiga do sonho!

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  13. Fiquei na dúvida se foi, então, de novo:

    Jorge,
    Imersa num mundo de pelúcias e Elvis, como bem deves imaginar, chego aqui como no tempo do Viagens, (saudades): ler-te sorvendo English tea n.1 ao leite, é quase um tipo de oração também, ou é.
    [Deixei preparada uma postagem com o título de: Templo e bênçãos, - mas que só publicarei semana que vem se der... (coincidência de universo religioso :) ]

    Ira, linda aquariana, sempre iluminada! Recordo-me do outro incipt dela postado no Viagens: “amo-te como quem te sabe e não te vê morrer”.

    Entre eu e eu, há um Galeano e um Saramago discutindo amigavelmente numa mesa de café e pensamentos. Concluíram os dois que desejam ser personagens de um filme de Blake Edwards :) E impera a serenidade. E assim sou, pois não pretendo desobedecê-los!

    A memória é como ouro, sim. Tão valiosa quanto, mas da mesma forma, sem serventia. Se saio à rua com joias, (digo isso tendo como referência o Brasil), o perigo de ser assaltada é imenso. O mesmo, se expor minhas memórias, pois elas têm valia aqui dentro, muito dentro..., do lado mais escuro do c(oração), entre orações subordinadas e insubordinadas que existem a bombordo do peito.

    Benedetti tem uma frase mais ou menos assim:
    “Se habito na tua memória, não estou só.”

    Agradeço por este momento sublime de poesia.

    Beijos e te cuida!

    PS.: Tudo bem? ... Qualquer coisa me avises, tá bom?

    PS.2: Sem o blogroll fica difícil saber quando atualizas ..., cheguei hoje ao acaso, pela vontade de orar :)

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    1. a memória é como o ouro, aninha, mas também a certeza de que o medo sempre veste o homem. aliás, na linha de benedeti, diria que aquilo que nos aproxima da eternidade é especialmente a memória, pois em cada pedaço de nomear nos refazemos vivos e inteiros qualquer que seja o estado, o tempo ou a circunstância.

      beijinho grande!

      p.s. não consigo, mesmo com o teu tutorial, ativar o blogroll no teu letrasdeanacecília. não sei o que estará a falhar... help!!!
      p.s. 2 e a pequenita luíse, acabou por ficar com uma ideia mais nítida de como são os táxis em portugal? :)

      beijinho de orvalho sobre ambas as pétalas!

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  14. Bri-lhan-te!!!

    Uma oração digna de espanto! Para se ler rezando....

    Beijo, poeta primoroso.
    Beijo, musa inspirada.

    Obeservaçãozinha: Desculpe minha ausência, tenho tido problemas técnicos pra chegar até a tua casa, mas ainda me sinto da família.

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    1. os reencontros são a mais fina poesia, cris. especialmente os reencontros com aquelas vozes que inauguram dizeres.

      beijos para ti, cris-a-tal.

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