o peso de sentir!
o peso de ter que sentir!
fernando pessoa, livro do desassossego
fotografia de eurico portugal
cabanelas - antiga fábrica de cerâmica do minho
é esta a clareira transparente:
bocas abertas e linhas por coser
enquanto aromas bucólicos engravidam
a alfazema das mãos
e os versos suados.
anunciam-se lábios frescos,
talvez mesmo corpos de hortelã
nesse bosque onde todo o lixo
é ramo vazio de aves
a extinguir o canto.
o sangue treme no corpo
e desce pelo silêncio da voz
até à margem do tempo:
é hoje!
é hoje que troco a sombra do passado
por um poeta anónimo
um par de linhas sem rima
e cinco dedos de pólvora
que riem de tudo
sem medo.
murmur breeze, float