sexta-feira, 25 de outubro de 2013

pedras da calçada da vida adentro [V]



Se não me amas, por que me avisas assim da dor?

Rosário Pedreira



fotografia de jorge pimenta: ícaro-homem


I. memória de um nome

é ele, o nome
a pontuar vigílias
nos lençóis
em cada regresso ao rumor
da noite:

é no silêncio
que disperso fantasmas
e toda a cal da sepultura.


II. carpe diem

o vinho
o amor
e toda a verdade:

só a vida pode desejar descansar
da vida.


III. poesia

poesia:
fome e alimento
osso ferida ressurreição
abelhas a acoplar o sangue
candeia cega
e alumbramento
olhos que veem para além das imagens

e eu aqui, moribundo,
sem saber como fecundá-la
com as minhas palavras.


IV. troia

entre o sangue de
páris
e o veneno de
helena:
o inexprimível universo
e cada um dos seus
nadas.


22 comentários:

  1. da memória de um nome: Xurxo Padron.
    Tenho falado muito em vocë, Xurxo... Muito.
    Aqui no Brasil, sua presença é mais esperada que a de Justin Bieber, entre os teen.
    Ouvi dizer que vai haver greve geral, caso vocë não apareça por aqui.
    Poesia é pão.
    ... e pão pode ser poesia.

    e Paulo Padeiro?

    este faz tudo. menos pão.

    jorgíssimo, vocë está a algumas semanas de se sagrar campeão brasileiro.
    Belo Horizonte lhe manda um beijo.

    Seu amigo de Bracara Augusta, aquele
    Robertus.

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    1. nomes que ameaçam a memória por nada saberem do tempo, robertílimo. e desafiar o tempo é, por um lado, a sua maior ousadia e, por outro, a certificação da verdadeira amizade.
      o brasil há de proporcionar-nos outros reencontros, reencontros alargados com poesia e pão. não será no paulo padeiro, mas que importa? somos nós que fazemos os lugares e toda a sua magia. já assim foi com d. helena, assim será com todos os que vierem - e que sejam muitos e repetidas vezes.

      já preparo o cachecol e a camisola para a grande celebração. vou ser, provavelmente, o único cruzeirista do mundo a festejar em tons de... encarnado - tons de lisboa, cores de portugal!

      abracilium, dom robertus limius!

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  2. Poesia: um assombro de beleza! Jorginho, você fecunda. Muito e sempre...

    Beijos,

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    1. quantas vezes se perde a mão, não se acha a semente ou se pensa que a terra é ruim?...

      sempre ternas tão especiais as tuas palavras e presença, taninha - beijos!

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  3. pedras colocadas cuidadosamente..
    cada beleza no detalhe..
    versos..
    beijo Poeta.. bom final de semana!

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    1. pondras a apontar passos, a desafiar distâncias. assim como a saudade, ingrid.

      beijinho!

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  4. Maravilhosa publicação, Jorge!

    Entre o sólido e o líquido,o corpo e o papel, eis a poesia em autofagia, digerindo memórias, esquecimentos e ex-aquecimentos. Alimentando-se de suas próprias palavras,
    e nos nutrindo de sua sopa de entrelinhas.
    Mesa servida entre iguarias raras e bom vinho, os poemas têm asas e nos fazem voadores: Ícaros sem acrofobia, na trajetória em eco, eco, ecoooo...

    E o amor... ai esse amor! Que seja pois uma refeição inteira acessível ao palato, a começar pelo coquetel de letras, seguido pelos primo e secondo piatto, e a alcançar a sobremesa, com direito a um derradeiro cafezinho :)

    Beijos dos Pampas!

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    1. uma viagem pela tua leitura, aninha, em que cada signo é muito mais do que a arbitrariedade que os define: fome-alimento-saciação, voo sem rota, rasto perdido e resto, rosto e rastilho, labirinto e fio de ariadne onde perder-se é apenas contingência de uma humanidade maior, plena, inteira, sem temores e fobias poluentes, venenosas, das que simulam cegueira e na falsidade do não-ver esventram e sugam a essência do que os gerou.
      no final, um cafezinho forte e quente ao pôr do sol dos pampas.
      do amor: quem ousa dizer que muito sabe?

      beijos dos vales verdes de terra húmida do minho!

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  5. Belíssimo!
    quando as palavras tomam vida no silêncio, tomam corpo e forma para além do que queremos e somos...
    "só a vida pode desejar descansar
    da vida"...
    Beijinho grande, querido amigo.

    p.s. música e vídeo, lindos, lindos!
    deixo-te esta melodia, encontrei num blogue amigo, acho linda,
    http://www.youtube.com/watch?v=5AGZuqB1rJk#t=17

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    1. sakamoto: que maravilha! recordo-me bem dele no inesquecível merry christmas, mr. lawrence, com o camaleoónico david bowie. a melodia é delicada, intimksta, quase imaterial! e aquele piano a guiar-nos as pulsações, curiosamente numa simetria perfeita de tons com a proposta musical que deixo neste post: tindersticks no seu melhor - pelo menos na minha opinião.

      um beijinho reiterando a tese: só a vida pode descansar da vida.

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  6. um trevo de quatro folhas,esta lira: eis a sorte de compartir!!

    beijos, poetamigo das imagens pulsantes!



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    1. o perfume das tuas palavras, jô. mesmo quando não faz poesia, sente-se a poesia.

      beijinho!

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  7. Belo vídeo, Jorge, mas as notas musicais soam tão tristes!
    Muitas vezes leio seus escritos e não sei o que dizer (rss). Tocam-me, levam-me à reflexão, nunca passam em vão diante dos meus olhos. E são verdadeiros e constantes meus cumprimentos. Bjs.

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    1. pensar a música que acompanha os textos é quase tão difícil quanto decidir-me pela fotografia que os ilustra. achei esta introdução de tindersticks, embora triste, ajustada ao tom destes inexprimíveis universos de nadas.

      um beijinho, marilene, grato pelo carinho que sempre transparece da tua presença!

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  8. este final em nadas é avassalador
    muito, muito além dos nomes
    que nos inscrevem


    abraço

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    1. a arbitrariedade dos nomes e a essência do que está para além deles. ainda que a cavalo de nadas e de quase tantos...

      abraço, assis!

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  9. memória de um nome

    há nomes transgressores do tempo quando em meio ao nada descobrem o tudo nas palmas das mãos
    quatro gestos teus que, de tão próximos, eu penso serem meus
    bj para um nome que habita minha memória

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    1. transgressores do tempo descalços de sombras por haver nomes, por haver gestos que, de tão singulares, se fazem traço inteiro na transparência do dizer - do ser: memória habitada por tantos nomes.

      beijo, ira querida!

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  10. E, no silêncio, a alma liberta-se, solta, gritante,
    Dispersa-se da razão e é Verdade...
    beijinho meu, querido poeta!

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    1. trajemos silêncios e os seus irreparáveis infinitos, querida amiga!

      saudades de te ter por cá. beijos!

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  11. Carpe Diem
    Mergulhei e fiquei sem respirar por alguns segundos.
    É preciso dizer mais?

    Uma linda terça feira.
    bjs.

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  12. Que quarteto dos deuses!

    De pedra em pedra o ser descaminha....

    Outro beijo, te admiro!

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