segunda-feira, 5 de agosto de 2013

papel de parede

fotografia de jorge pimenta

I.
não me deixes só em cada um dos meus morreres.


II.
o universo e todas as coisas:
o erro grosseiro de pensar em vez de sentir.


III.
o inverno nas minhas próprias vozes:
sofro desse frio que não pertence
nem à vida nem à morte.


IV.
esperava a vertigem das mãos
a percorrer-nos por dentro
mas
o mar acabou por desviar-nos o
peito
antes do rosto adormecer no
silêncio.

conseguirei gritar
para o lado onde se inclina o vento?


V.
minto para não saber a verdade:
eis o peso trágico de ter de dizer.

fotografia de jorge pimenta


21 comentários:

  1. Esse é um clamor de quem já sabe de quantas mortes são feitas a vida. Inútil clamor, que a solidão é mãe que embala no colo todas as despedidas. "não me deixes só em cada um dos meus morreres".

    Tudo tão belo e profundo. Mas o morrer sempre me fisga. Fisga-me quem já pôde morrer tantas vezes.

    Beijos, poeta!

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    1. tantas mortes e ainda mais os renasceres: eis o mandamento sagrado de quem ama, taninha!

      beijos!

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  2. "o universo e todas as coisas:
    o erro grosseiro de pensar em vez de sentir."

    querido amigo, tocaram-me sobremaneira estas etiquetas em papel de parede, papel de vida, vertigem de emoções...
    imagens imensas, tocantes...
    Beijinho grande!

    p.s. em férias...em busca do mar e dos seus segredos...

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    1. mesmo em férias, a palavras humedecem-nos os sentidos, querida amiga.
      que o mar se faça todo ele epifania nestas férias em tons de azul; beijinho!

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  3. Jorge,
    outro dia, tendo que obedecer a uma pauta que eu mesma me impus de enviar uma crônica por semana aos jornais, e não tendo um assunto específico para escrever, acabei optando por discorrer sobre o 'nada'. Curiosamente, chego aqui e, apesar de esquisito, vou citar a mim mesma (deve ser coisas da idade ou do colesterol alto :), porque senti um tanto destas palavras que aqui deixo de um parágrafo:

    - Sobre o nada -
    O nada também pode ser um silêncio, a ausência de palavras, a ausência de carinho, a ausência em si. É quando deixamos de ser plenos porque sentimos falta, e o que sobra não sustenta a existência. As reticências mudas abrem inúmeras interpretações: não existe palavra mais cruel do que a que não é dita. Não existe maior tortura do que um carinho esperado que não chega.

    Beijos!

    PS.: Por aqui, muuuito trabalho... Envio-te notícias na madrugada.

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    1. dois pontos assimétricos, uma sombra e os passos sem medição algures pela superfície (terra, água, solo lunar?), enquanto os lábios se fecham em reticências brandas: há tons claros à superfície do banco onde a existência começa e se refaz alheada a todas as mortes e sortes: é o vazio em autoimplosão .

      beijo, aninha!

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  4. Jorge, antes que eu me esqueça, e faço questão:
    Bah, fotaços! Em especial essa primeira. Incrível a edição, composição e profundidade conseguidas a partir da pontuação da figura humana no contexto do grafismo, e os tons cintilantes obtidos pelo jogo de luz que sugerem, mais do que mostram, aquilo que mais temo: a altura :)
    Perfeita! Parabéns!
    Penso que estás mais que pronto a ilustrar meu livro, (se milagres existem), de crônicas, heim? :)

    Mais beijos!

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    1. se os meus olhares soubessem estar à altura das tuas letras...

      beijinho!

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  5. A palavra, ao mesmo tempo, servindo de cova e de sublimação aos nossos morreres!

    Belíssimo!
    E que maravilhosa amostra de sensibilidade é a fotografia!!

    Beijos, poeta amigo das tantas imagens!!

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    1. somos assim como que gatos de duas patas, com tantas vidas e ainda mais morreres...


      beijinho, poetamiga!

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  6. vazio da melodia
    o silêncio
    retorna à pele

    e dela não há resposta
    que se retire de duas sílabas

    sente na carne

    [os dedos a desprender vertigens]
    e só pronuncia o que é


    .


    caminho com o vento, leve
    despindo rumos


    ...

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    1. "caminho com o vento, leve
      despindo rumos"

      assim, em palavras mágicas, se faz tão necessário morrer...
      que maravilha, dani!

      abraço!

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  7. Maravilha, principalmente o último. Adorei!
    Beijo.

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  8. fisgadas estão as palavras
    feito larvas no reboco
    este existir como um soco



    abraço

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    1. engodo neste mar de peixe e tantos anzóis, as palavras...

      abraço, caro amigo-poeta!

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  9. Dos vários morreres para os vários renasceres, enquanto isso acontecer, mergulhemos na vida!
    Abraço.

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    1. é desses pequenos ciclos de voltas (im)perfeitas que nos fazemos, um dia após o outro, uma morte após a outra...

      abraço, eduarda!

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  10. Viva, amigo Jorge!

    A poesia das imagens e das palavras em simbiose perfeita.

    Vários morreres, implicam vários viveres. E isso pode ser bom...

    Um forte abraço.

    Rui

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    1. rui, caro amigo,
      que maravilha saber-te por aqui! este blogue começou pela palavra, entretanto, outras linguagens foram ganhando fulguração em mim sendo a fotografia uma delas; passei, pois, a procurar combiná-las ambas. se, numa primeira fase, mantive via blogue vivos os contactos com os amigos da palavra, presentemente vão aportando outros que fiz mais recentemente no universo da fotografia. e a conclusão a que chego só pode ser uma: a escrita e a fotografia partilham a mesma matriz genológica: o sentir - e sentindo, vamos sendo, mesmo quando o chão parece desaparecer-nos de debaixo dos pés - inevitavelmente.

      abraço!

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  11. Fragmentos de um todo atordoado.

    Você entende do riscado!

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