Dói-me o intervalo que há entre o que pensais e o que dizeis… […]
Não sei que é isto mas
é o que sinto…
Fernando Pessoa, O
Marinheiro
fotografia de eurico portugal
perguntas-me
o que sou capaz
de ainda
reconhecer.
desvio-me da
pergunta
como quem
tropeça,
evito os
estilhaços
e volto-lhe
as costas
[toda a
linguagem queima quando
desferida
por lábios
a afiar as
lâminas dos deuses].
para trás, a
certeza de
de uma
distância percorrida
devagar por
nunca saber o que respira entre
as palavras
e o horizonte que as
delimita,
dois ou três
livros sublinhados
pelo olhar,
tardes
esquecidas que vieram comer
a luz,
copos a
vigiar a noite
e um
silêncio, como os cabelos,
estendido
por fora da gola
e de alguns
flocos de frio tombados.
de tudo te
escondi:
álcool,
poemas, palavras azuis, chão,
cães e ruas a farejar
nomes
um espelho
vazio e alguns
[mais do que
desejei]
agora não, depois sim, talvez mais logo,
de tudo fugi
e só a quase nada
deixei
debicar migalhas
de certezas.
que é feito do
tecido com poros
escancarados
à espera que
a noite selasse palavras
em
dissolução lenta, rasteira,
quase
invisível na mudez
de mim?
escondemo-nos
num silêncio
que talvez
nunca tenha sido
nosso,
tantas vidas
esquecidas
e o olhar de
costas para a porta que teima
em permanecer
fechada…
ambos
dissemos já o silêncio. e agora repetimo-lo
com todas as
palavras.
este dístico final é assombroso de realidades,
ResponderEliminargrande abraço
um abraço de silêncios-palavras, assis!
EliminarPoeta, querido! Muitas imagens aqui maravilhosas, embrigadas e embriagantes, mas realmente esse final é um achado!
ResponderEliminarE eu embriagada. Aqui, sempre.
Beijos,
taninha,
Eliminarsempre muito especiais as tuas palavras, dessas que fazem eco em todos os anos e naqueles que os habitam.
beijo grande!
Os meus dois comentários não foram publicados. Uai! porquê? Algo de errado aconteceu no envio dos comentários, se calhar, ou disse algo de errado, ou...
ResponderEliminarNo primeiro falava do poema anterior e no segundo perguntava qual era o filme do tarantino que o Eurico fotografou para ilustar o poema "depois[ou o tempo advérbio na linguagem e na boca]. gostava de saber, por curiosidade.
Este poema é um achado seu que devorei até ao tutano das palavras silenciosas, especialmente a última estrofe.
obrigado, célia!
Eliminarsobre o filme de tarantino: a verdade é que não fotografei nenhum frame de um filme dele, dizia, antes, que para a foto me tinha inspirado num filme de tarantino; [confesso que não sei já de qual se trata e não sei mesmo se foi num filme dele ou num qualquer movimento onírico meu...].
um abraço!
O silêncio nunca é de ninguém...
ResponderEliminarHá aqueles que ele cativa...
Se prende?
Há um silêncio cativante em tuas palavras!
Beijo, meu amigo!
o silêncio de ninguém que a todos toca... algumas vezes sem deixar que o toquemos. sei-o com palavras... sei-o sem elas.
Eliminarbeijinho, jô!
Percebo que muito do que fugimos vai parar no poema, com esse lugar de destaque, fazendo troça da sombra, nosso lugar de refúgio.
ResponderEliminarBeijo.
e quantas coisas se fazem mais próximas quanto mais delas pensamos fugir?
Eliminarbeijo, larinha!
da boca pra fora: os mísseis de longo alcance
ResponderEliminarda boca pra dentro: um detonador solitário
Tonta, por mil anos, com tantas imagens inquietas
bj grande, meu poetíssimo
ai, e a explosão que tarda...
Eliminarbeijos, iríssima!
Um crescendo de imagens e sentires para um final magistral.
ResponderEliminarDeixo-te o silêncio do meu beijo e votos de Páscoa feliz.
um abraço sem imagens mas de sentires para ti, sandra.
EliminarEurico, querido,
ResponderEliminarmaravilhoso poema!
Peguei viagem por um caminho paralelo do silêncio, e por aqui deixo um poema do mexicano Jaime Sabines: "Yo no lo sé de certo".
"Yo no lo sé de cierto, pero supongo
que una mujer y un hombre
un día se quieren,
se van quedando solos poco a poco,
algo en su corazón les dice que están solos,
solos sobre la tierra se penetran,
se van matando el uno al otro.
Todo se hace en silencio.
Como se hace la luz dentro del ojo.
El amor une cuerpos.
En silencio se van llenando el uno al otro.
Cualquier día despiertan, sobre brazos;
piensan entonces que lo saben todo.
Se ven desnudos y lo saben todo.
(Yo no lo sé de cierto. Lo supongo.)"
Beijos muitos,
no aguardo de um novo poema para ver e ler!
aninha,
Eliminarque melhor resposta ao verso senão com outro verso. e como pelas tuas mãos se me abre um tão vasto horizonte de autores fantásticos que desconhecia e de suas linguagens indecifráveis - porque se sentem à bolina das palavras. até porque há silêncios que repetimos com todas as palavras: "Yo no lo sé de cierto. Lo supongo."
beijinho!
querido amigo, chego tarde mas não tão tarde assim... para te ler o tempo dilui-se em tudo, menos importãncia.
ResponderEliminar"para trás, a certeza de
de uma distância percorrida
devagar por nunca saber o que respira entre
as palavras e o horizonte que as
delimita..."
sempre belo, sempre horizonte...!
beijinho grande!
imenso horizonte é o da tua amizade que percorre todas as minhas fases de escrita: circum-viagem, viagens de luz e sombra, agora este orvalho... obrigado, querida amiga!
Eliminarum beijo!