quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

ode à respiração sem pausas


Há olhos que só olham o sonho; e, quando
o sonho se dissipa, ficam cegos.

Nuno Júdice, in Viagem


fotografia de jorge pimenta


quando me chegas,
dedos magros entornados na luz,
cai sobre nós
um arco de açucenas e espantos que,
de vento em vento,
tomba pétalas
na gramática dos corpos

demoras no céu da boca cáries
e abismos de boca
a atar sorrisos à estação fria,
porque entre os gomos e a árvore
crescem lâmpadas da palavra inteira,
rotas de lua rasa a enfeitiçar o sul
e a eterna porta entreaberta para
o desassossego
de viver milhões de mundos
que aprendemos a escrever
no silêncio de ervas queimadas e ramagens
sem folhas

é esta a paisagem onde vicejam
corações:
repara como nos cabe no peito
mesmo que em dias cinzentos
a abandonar flores.



25 comentários:

  1. quando me chegas,
    dedos magros entornados na luz,
    cai sobre nós
    um arco de açucenas e espantos que,
    de vento em vento,
    tomba pétalas
    na gramática dos corpos ... Inesgotáveis imagens belas e raras, nessa mestria de embriagar os sentidos! Bravo, bravo, Jorginho!!! Beijos

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    1. as palavras são tantas das nossas primaveras, verdade, taninha?

      beijo grande para ti, alguém que, pés descalços, sabe caminhar sobre o ar!

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  2. tudo tão belo, poema e fotografia, quanto essa porta entreaberta para o desassossego.de viver milhões de mundos. o homem sobrevive ao corpo se ainda consegue guardar no pulso ao menos um poema.

    bjs, poeta dos milhões de mundos que percorro espantada

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    1. só ele, o poema, em tempestade de pele e revoada de peito a chicotear-nos o eterno fogo de uma existência além-corpo... a outra parte do ser resistirá a esta sangria?

      beijinho, ira-estrela-no-nevoeiro!

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  3. No meio das pedras a gente sente o conforto do limo, embora escorregadio... Penso que assim é o amor!

    Tu e tuas imagens pulsantes, meu amigo poeta! Beijo para toda a ausência!

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    1. titubiâncias e a quase certeza de não poder permanecer de pé... assim será o amor, neste jogo de limos e efervescências por debaixo dos pés.

      beijinho, poeta de lira e espanto!

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  4. Respirar sem pausas é ficar ofegante. Quando se fica ofegante sente-se o mundo em voragem. Quer-se abarcar tudo de uma só vez, mas não é possível. Quando se ama, indiscutivelmente há sempre pausas. O que até é bom...
    Beijos ao poeta.

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    1. é a essa respiração invisível, que ora entumece, ora faz mingar o peito, que nos agarramos quando todos os mundos se subjugam a esse horizonte-pulsação que se afasta à medida que lhe apontamos os passos...

      beijos, ricarda!

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  5. Di-vi-no!!!!

    " quando me chegas
    demoras no céu da boca cáries
    é esta a paisagem onde vicejam"

    (não resisti ao resumo da ópera)

    beijos cris-tais, poeta primoroso*

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    1. a verdadeira melodia começa na tua pauta, cris-tal!

      um beijo e um sempre rasgado sorriso ao pressentir-te por cá!

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  6. Um canto em que habitam tantos mundos
    em poucos minutos,
    onde não há pausas para respirar.

    L'amour!

    Beijos, poeta querido!

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    1. mesmo quando nesse mundo habitado pela respiração os frutos amadurecem antes do tempo e se desprendem tombando, sem pausas, na erva que os há de consumir...

      l'amour :)

      beijinho, marlene!

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  7. A fotografia é excelente, Jorge.
    E lá ao fundo, "crescem lâmpadas da palavra inteira".
    É sempre um gosto entrar neste espaço.

    Bom domingo.
    Beijo

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    1. a fotografia não resultou como pretendia, pois perdeu um tanto de profundidade; por outro lado, se alterasse o ângulo para reforçar a profundidade, perderia a mensagem de fundo, inscrita na parede, aquele "amo-te" rebelde com que os anónimos gritam a sua falsa coragem para um espaço órfão de eco...
      só mesmo ali, naquelas palavras roubadas ao peito, "crescem lâmpadas da palavra inteira".

      um beijinho feliz por este reencontro de vozes, sónia!

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  8. Sinceramente, querido amigo, não sei de forma exata o que é sonhar no amor sem realizar. Por isso, meu comentário não será tão genuíno como eu gostaria.

    Conheci o Pedro numa discussão sobre política em um curso de pré-ingresso da faculdade, (nós gaúchos cultivamos o hábito de discussões intermináveis sobre aspectos político-econômicos-sociais). Ele, então militar da Força Aérea Brasileira; e eu, já designer gráfica e a idealista de sempre, com tendências mais esquerdistas. E a discussão, muito calorosa, evoluiu para o relacionamento que no próximo dia 25, completará 19 anos de casamento, mais uns tantos de namoro e discussões políticas :) Posso afirmar em 100% que discussões políticas podem alimentar o amor :)
    Mas todos estamos sujeitos a equívocos, ilusões, tropeços, 'meter os pés pelas mãos' (como se diz no popular). O ser humano é imperfeito, somos sexuados, e viver não vem com manual de instruções.
    Tudo faz parte de nossa biografia: o amor, a dor, o sexo, os equívocos.
    Somos ricos em sermos pobres e pobres em sermos ricos.

    Agradeço-te por tua Poesia imensa me instigar mais uma vez.

    Beijo-te a ponta dos dedos com que digitas essas preciosidades, Jorge!

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    1. aninha,
      o que em nós é essencial não tem pré-definição; aparece, cresce, amadurece, vive, mirra e morre, algumas das vezes antes mesmo que o tempo nos cumpra completamente. e isto sucede de tal forma natural que muitas das vezes nem conscientizemos o percurso ou até mesmo o que se nos inscreve na pele. todavia, neste processo, muitas das vezes perdemos as barcas ou deixamos de ver as ilhas...

      um beijinho de orvalho e o imenso prazer de sentir que as palavras que aqui se soltam aprenderam a navegar mares e marés!

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  9. a foto é excelente, e consegues sempre aliar as palavras certas.
    e nos cinzentos também se entornam sóis, nem sempre visíveis,
    bom fim de semana.
    beijos

    ;)

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    1. são esses os sóis mais difíceis de encontrar, piedade, os que sabemos existirem mas não sabemos bem onde, até porque gostam de jogar às escondidas com a pele que os persegue :)

      um beijinho!

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  10. eu fico a medrar palavras
    que caibam na existência
    mas elas fogem em devaneio


    abraço

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    1. e depois da existência dita, combustão de boca, quantas mais sobram nesse fugidio terreiro de vazios?

      abraço!

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  11. "A porta entreaberta para o desassossego" está sempre permeando os caminhos do amor, vestidos de ansiedade e interrogações. Suas fotos são mágicas, como aquelas, invisíveis, escondidas em seus versos. Bjs.

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    1. quanto em nós é certeza e definição?

      palavras que afago no peito, querida marilene. beijinho!

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  12. Belas as tuas palavras, neste desassossego de viver milhões de mundos :)

    beijinhos

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    1. desassossego de viver milhões de mundos... sabendo que uns tantos apenas se fazem verdade a galope das palavras :) seres plurais somos nós todos, afinal, verdade'

      beijinho, rita!

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  13. mesmo nos dias mais cinzentos, o manto viçoso da esperança ergue-se vitorioso...
    o amor gera desassossego...desassossego é vida...vivamos!!!

    beijinho, querido poeta - amigo !

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