sábado, 5 de abril de 2014

dúvidas para existência feminina e alguns nadas



sou eu
que habita a capital
do teu poema
num prédio
mal iluminado.

Ana Salomé, Ode do casaco vermelho


fotografia de jorge pimenta


de que gesto te serves para
lhe chegares ao corpo
impresso de ambos os lados?
quantas mentiras chamas às mãos
no palco da feminina melancolia
a escalar desejos
e impossíveis?
onde o viés da coxa
espetada no centro,
tensa, peregrina, mulher
por entre gemidos e espanto?

é verdade,
as palavras dispersam primaveras
e os silêncios também morrem
de amores
como os homens
reclamando sucos
gritando vertigens
empurrando a carne para despistes
e todo o corpo de encontro ao muro
que disseste sábio e transparente
como línguas a ocultar promessas

por debaixo da pele
cingida no elástico da cinta
onde navios adivinham
o porto em que podem morrer
estremeço:

- quem serás tu,
afinal?

o cabelo solta-se
descobrindo uma paisagem
inabitada a oeste da anca
como se tudo o que se espera
fosse demasiado:

- apenas certeza e quase mulher
a dar de mim o que já não posso.

e nesse dia descobrimos ambos:
todos os livros guardados na mesinha de cabeceira
são anteriores ao tempo
mas nunca partem para longe.


21 comentários:

  1. Quanto tempo sem te visitar hj
    vim deixar meu carinho e elogios peoo
    belo poema, a imagem linda combina com a
    sensualidade dele parabéns mais uma vez

    Bom fim de semana
    Bjusss
    ___Rita!!

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    1. somos cada reencontro e todas as suas horas.

      beijinho, querida rita!

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  2. a existência feminina é tão incerta quanto a certeza de alguns nadas...

    e os silêncios vão morrendo de amores, pois tão pouco escapa de ser saudade!

    beijos, ainda com saudade, meu amigo das imagens pulsantes!






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    1. aprender a escutar silêncios é recuperar o que de mais verdadeiro possa habitar-nos, nesta existência sem género, raça ou pátria, existência em que escondemos cada pedaço de fruto mal roído...

      beijos, jô, nesta luta incessante com os adversários do quotidiano a que chamamos tempo e que me afastam de quem tanto gosto...

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  3. Jorge,
    nós mulheres somos seres extremamente complexos, temos muitas fases e um tanto que nos habita. Inevitavelmente, em algum momento ou vários de nossas vidas, seremos tomadas por dissimuladas, sedutoras "femme fatale", ou quem sabe protetoras, líderes, cruéis e um tanto mais. Essa taxação me incomodava muito quando era bem mais jovem. Mas desde sempre adotei a seguinte conduta:
    se sinto saudades de um amigo, colega, etc., digo-lhe que sinto saudades;
    se alguém é importante para mim: "você é importante para mim";
    ao sentir essa coisa inexplicável que é o amor (de mulher para homem), então fiz/faço silêncio: os meus olhos dizem e o mar os escuta, e isso é o suficiente.

    Belo e instigante poema, como todos que escreves.
    Espero que teus papais estejam bem, caro amigo.

    Beijos!

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    1. queimar o verbo na entronização de cada um dos silêncios: sermos pássaros em quem as manhãs entornam as asas num respingar leve de vento e rota. sermos todo o mundo mesmo que a cor se faça amarga no fim da tarde. sermos o que sentimos e todos aqueles que guardamos no interior da respiração... tudo o mais é excessivo.

      beijinho!

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  4. Querido amigo, incrivelmente belo quanto intenso!
    a silhueta feminina quase horizonte e as tuas palavras...

    beijos!

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    1. "a silhueta feminina quase horizonte e as tuas palavras..."

      a tua leitura é todo o poema, querida andy! beijinho com saudades da tua escrita.

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  5. Na imagem (excelente), um caminhar para a luz da vertigem, do grito, do gemido e do espanto. Nas tuas palavras, adivinha-se o encontro com este horizonte, que sempre se afasta. Tudo se passa, realmente, "num prédio mal iluminado".
    Belo e intenso poema. Tem uma boa semana, Jorge.
    Deixo um beijo.

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    1. esse caminhar para a luz e as suas vertigens de rosto tantas vezes sujo pela aspereza das palavras com que lavamos os dias, os fracassos, as inconsequências de ser... chamemos a voz do corpo "num prédio mal iluminado" como quem recita um poema; faça-se alvorada no interior do olhar.

      beijinho, sónia. sempre tão queridas a presença e as palavras!

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  6. anterior ao tempo
    um templo
    um caos
    fiat lux



    abraço

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    1. todo o tempo
      caos
      casos
      cacos...

      há um momento em que desinfetamos a boca no silêncio... e depois renascemos - fogo fátuo.

      abraço!

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  7. leve a sério o meu silêncio, apenas, pois tudo mais existe menos.

    já estava imensa a saudade. volto. pq sim!

    bj, meu poetamigo de todos os versos que habitam em mim

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    1. junto-te o meu silêncio, querida ira, pois quantas vezes ele me habita por dentro?...

      um beijo com as mãos trémulas de tanto procurar...

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  8. Amigo poeta uma poema que toca na alma,
    é sério ,
    é lindo ,
    é triste
    que vida incerta.
    Beijinhos,Evanir

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    1. são assim os versos, querida evanir, doença e cura de cada uma das nossas loucuras.

      beijinho, grato por este reencontro!

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  9. Sua foto é muito bela. Há um pouco de luz, apenas, sobre a mulher, que permanece indefinida e tão somente imaginada. A mesma sensação me trouxeram seus versos, a ocultar mais que mostrar, culminando na interrogação "quem serás tu?" . Talvez nem ela saiba. Bjs.

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    1. somos assim mesmo marilene: muito mais insondáveis do que exprimíveis.

      beijinho grande!

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  10. Não resta dúvida que você é um poeta primoroso.
    Um dos melhores, que conheço.

    Beijos cristais, queridíssimo!

    Gravo-me em gestos
    Quando sinto
    Saudades das mímicas

    ...

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    1. sabemos que de todas as sementes, o verso é a mais preciosa e que em ti se con-funde com a amizade.

      beijinho, amiga-poeta de cris-a-tal!

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  11. a imagem acompanha muito bem o poema , um misto enigmático, uma sensualidade latente e tantas utopias e certezas escondidas.
    gostei!
    :)

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