sexta-feira, 16 de novembro de 2012

palavras crepusculares para tela, girassóis e algumas metades [ou van gogh renascido]


nunca me preocupei em reproduzir exatamente
aquilo que vejo e observo […]
cortei-me uma orelha e o mistral sopra agora
só de um lado do meu corpo e os pomares estão em flor…

Al Berto, Última Carta de Van Gogh a Théo


fotografia de eurico portugal



volto-me inteiro para as suas metades:
girassóis, jarra, tela
e se uma pétala de sol se quebrar
entre as mãos e a flor
erguê-la-ei nos meus campos
solitariamente agitados pelo silêncio.

vejo-as sorrir
acenar sem timidez
porque nenhum vento ou tempestade
as arrancam à nova existência
agora sem terra, raiz, seiva,
apenas óleo e cor.

e nem as sombras que dormem comigo
me iluminam a memória
com que outrora acendia o corpo,
e nem a respiração pequena
me recorda segredos
capazes de me vencer
porque junto pétalas, telas e girassóis
aos mistérios do homem
e, sem bater à porta,
ressuscito poetas no verso branco
a aprender a arder nas mãos do deus
que nunca soube rezar.

saberá ainda amar?


7 comentários:

  1. Intenso, visceral, forte, delicado ...e focado, não me atreveria a destacar nenhuma imagem do todo - coisa-mais-linda-isso! É, sem dúvida, um dos teus poemas mais bonitos, Eurico, e o vídeo cumpre a vestimenta perfeita,
    imenso abraço

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  2. porque junto pétalas, telas e girassóis
    aos mistérios do homem
    e, sem bater à porta,
    ressuscito poetas no verso branco
    a aprender a arder nas mãos do deus
    que nunca soube rezar.

    Saudades que andava desse lirismo, saudade que estava desse delírio, saudades que estava dessa parte de mim, tão sem voz, que os teus versos, e só eles, traduz.

    Beijos,

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  3. Caro Eurico,
    belo..., muito muito belo!

    Recordei-me de uma frase do filme Strictly Balroom (uma produção australiana de 1992):
    "Vivir con miedo es vivir a medias".

    Mesmo que minhas palavras por ventura aqui não cheguem, tenhas certeza que sempre te lerei. E bem sabes por que.

    Beijos!

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  4. O corpo do poema é absurdo de lindo, ainda mais, pq insinua sombras das quais é impossível se desvencilhar.
    Realmente, um poema agitado no silêncio. Magnífico!
    bj e mais bjs, poeta e tanto!

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  5. as molduras não limitam o olhar... nem a retina!

    Nossa!! Tão bom te ler!!

    Beijo, Eurico poeta!

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  6. há pétalas que o sol pinta na sombra de um caminho,
    os teus versos de orvalho, luz para os meus olhos, de tão belo!

    beijinho, eurico!

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  7. desculpa, volto porque não posso deixar de dizer que simplesmente adoro esta música, e as palavras de Al Berto...sempre!

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